quarta-feira, 10 de junho de 2009

Jackie Stewart, 70 anos! - A biografia (2ª parte)

(continuação do capitulo anterior)


A temporada de 1966 começa primeiro com a vitória no inicio do ano na Tasman Séries, o campeonato de Formula 1 que acontecia na Austrália e Nova Zelândia, e quando o campeonato começou oficialmente, com uma vitória retumbante na corrida inaugural, disputado nas ruas do Mónaco, a bordo da sua BRM. E poucas semanas mais tarde, nas 500 Milhas de Indianápolis, a bordo do Lola T90-Ford, Stewart ia a caminho de uma inédita vitória, quando uma avaria de uma bomba de combustível, a oito voltas do fim, o impediu de vencer à primeira a mítica corrida americana. No entanto, a sua prestação na prova lhe valeu ter sido eleito pelos pares como o “Rookie do Ano”, numa corrida onde outro “rookie”, Graham Hill, foi o vencedor.


Após as 500 Milhas, Stewart foi correr o GP da Bélgica, realizado no enorme traçado de Spa-Francochamps. Então com 21 quilómetros, era um circuito tão desafiador com o de Nurbrurgring, na Alemanha e tal como ele, estava sujeito aos caprichos do tempo. Nessa corrida, ganha por John Surtees, na sua última vitória ao serviço da Ferrari, Stewart tem o acidente mais marcante da sua vida, que o iria despertar para a pouca ou nenhuma segurança existente na altura, e que seria a sua causa durante a sua carreira de piloto.


Eu devia ir a uns 265 km/hora quando o carro entrou em acquaplaning e perdi o controlo. Primeiro bati contra um poste telegráfico e depois entrei na fazenda de um lenhador e acabei na cave exterior de uma propriedade. O carro ficou todo retorcido, comigo preso dentro dele. O tanque de combustível tinha rebentado internamente e o monocoque estava todo cheio de gasolina, que enchia o cockpit, O painel de instrumentos fora arrancado e encontrado a uns 200 metros do carro, mas a bomba de gasolina elétrica continuava a funcionar. Não conseguia retirar o volante e não conseguia sair dali”, contou anos depois, na sua autobiografia.


O primeiro a socorrer foi o seu companheiro de equipa Graham Hill. Ele contou na altura como foi o resgate: “A primeira coisa que fiz foi desligar tudo para a bomba não puxar mais gasolina para dentro do carro e para não haver o perigo de alguma faísca. A gasolina estava a queimar o Jackie, isso pode até arrancar a pele de uma pessoa somente pela reacção química. Tentei levantá-lo, ele estava atordoado e queixava-se de dores no ombro. Foi quando vi que tinha de retirar o volante para o retirar, mas estava preso contra as suas pernas. Corri para pegar uma caixa de ferramentas junto de um comissário. Foi então que conseguimos tirar o Jackie do carro e ficar seguros que o BRM não se ia transformar numa tocha.


Levamo-lo para uma propriedade e despimo-lo. Não chegavam os socorros, pelo que telefonei de um posto de comissários. Quando as enfermeiras chegaram, a primeira coisa que fizeram foi tapar o Jackie com o seu próprio macacão ensopado em gasolina! Foi uma luta com elas, que estavam mais preocupadas com a nudez do que com a saúde dele
”, referiu.


Stewart continuou depois o seu relato: “No meio delírio, nem sei mesmo se elas lá estiveram. Tinha magoado o pescoço, deslocado o ombro e fracturado costelas, com mais umas contusões nas minhas costas. No entanto, a minha maior preocupação era estar ensopado em gasolina. No fim, tive queimaduras e a toda a minha pele caiu.

O edifício para onde fui levado, um tal de centro médico mas na realidade mais parecia uma lixeira, com pontas de cigarros e porcaria. Meteram-me numa ambulância e levaram-me para o Hospital de Liége, ainda longe. Para piorar as coisas, o condutor da ambulância perdeu-se da escolta policial e não sabia o caminho. Apesar de todos estes precalços, seis horas após o acidente, estava no Hospital de St. Thomas, graças a Louis Stanley
[patrão da BRM]”, concluiu.


O piloto escocês ficou de fora na corrida seguinte, em Reims, mas regressou ao activo em Brands Hatch, palco do GP de Inglaterra. E aí tinha tomado medidas preventivas, em caso de novo acidente: “Coloquei no meu BRM uma chave de fendas no meu cockpit, colada com fita adesiva, com instruções escritas em tinta fluorescente na língua do país onde estivesse correndo. Era um pormenor importante para quem ficasse preso num carro, como eu”, afirmou.


Graças à ajuda do seu patrão, Louis Stanley, decidiu implementar medidas no seu carro, como o uso de cintos de segurança, volantes removíveis, e capacetes integrais, para além de uma ambulância médica, para socorrer os pilotos no local, em caso de acidente. Contratou um médico que o acompanhava em permanência. Mais tarde, estas medidas ajudaram a revitalizar a Grand Prix Drivers Association (GPDA), para pressionar os organizadores para melhorar as condições de segurança das pistas. Algo que foi criticado na altura por pessoas como o ex-piloto Stirling Moss:


Eu fui presidente da GPDA em 1963 e tentamos motivar os organizadores a melhorarem os circuitos, sobretudo para os espectadores. Não defendemos que devem ser cortadas árvores, por exemplo, eliminar coisas que os tornam interessantes. Não queremos zonas de escape. Nós gostamos dos riscos naturais, como no Mónaco, ou de precipícios. Gostaríamos de fazer um circuito à volta de Hyde Park ou Central Park sem mudar nada na sua topografia. Não tem graça jogar a feijões…”


Anos mais tarde, Stewart defendeu-se destas acusações na sua autobiografia: “A minha postura era de que, como piloto, estava a ser pago pela minha técnica de pilotagem. No entanto, não era pago para por a minha vida em risco. Foi muito difícil conseguir apoio para o que queria. Havia criticismo de alguns pilotos e os media, com algumas pessoas a afirmar que se eu não conseguia aguentar a pressão, devia ir embora. Fui acusado de tentar embrulhar os pilotos em lã e algodão, e de roubar todo o romance e espectacularidade em volta da competição. Este era um desporto em que as lesões graves e a morte rondavam a toda a hora, e não havia uma infraestrutura para o apoiar, e muito poucas medidas de segurança para o evitar. Por isso achei na altura que devia fazer alguma coisa”, afirmou.


E a sua luta valeu a pena, mesmo na altura. Alguns pilotos o defenderam, como o neozelandês Chris Amon, que disse uma frase que resumia tudo: “Jackie falava por todos nós. Ele era o único com coragem para o fazer”. E anos depois, quando resumiu a sua carreira, afirmou: “Se tiver algum legado que gostaria de deixar ao desporto, espero que seja na área da segurança, pois quando cheguei à Formula 1, elas não existiam ou eram diabolicamente insuficientes”.


Em termos competitivos, o resto da época foi discreto: só conseguiu mais duas classificações nos pontos e o sétimo lugar no campeonato, com 14 pontos. Nessa altura, a formula 1 passava por uma era de transição, com os motores de 1.5 Litros a serem substituídos por os de 3 Litros, e a BRM era das poucas a ter o seu próprio motor, o H16, que era pouco fiável e pouco competitivo, face aos motores Repco V8 da Brabham e aos novos Cosworth V8 que só se iriam estrear no ano seguinte.


Prova disso foi que na temporada de 1967, Stewart conseguiu apenas dois pódios e dez pontos no total. Nessa altura, corria com Ken Tyrrell na Formula 2, a bordo dos seus Matra M5 ou M7S, e ganhara quatro provas na Europa: Karlskoga, na Suécia, Albi, em França, Enna-Pergusa, em Itália e Oulton Park, na Grã-Bretanha.


Nessa altura, a Matra tinha-se decidido aventurar-se na Formula 1, com o apoio do estado francês e sob a liderança de Jean-Luc Lagardére. Ele iria construir um motor V12 (que ficaria na história com o seu silvo característico), mas precisava de um piloto e um “manager” competitivos para a sua equipa. Com Ken Tyrrell a cuidar da sua equipa de Formula 2, a escolha foi natural, mas Stewart trazia consigo um fornecimento de motores Cosworth, pois era apoiado pela casa, através de Walter Hayes, então vice-presidente da Ford para a Europa. Com motor e piloto, o chassis Matra era combinação ideal para Stewart arriscar uma mudança. Assim o fez, no inicio da época de 1968, e iria ficar até ao final da sua carreira.


(continua amanhã)

1 comentário:

Bruno disse...

Olá, Speeder
Hoje o comentário do Stirling Moss chega a ser absurdo sobre a segurança, mas se olhar a própria frase que fica no banner do seu blog, representa bem o que os pilotos antigos pensavam.

Ainda bem que Stewart encabeçou o movimento e teve coragem para romper com os dogmas de tantas décadas. Ainda bem que conseguiu suportar as críticas e se manter firme na decisão.

Agora que irá começar o domínio de Jackie e seus títulos...não perco o próximo episódio.
Abraços.