terça-feira, 29 de dezembro de 2009

A Formula 1 numa encruzilhada

Como sabem, o ano de 2009 ficou bem marcado pela luta entre a Associação de Construtores de Formula 1, a FOTA, e a FIA, a entidade suprema do automobilismo, representada no inicio do ano por Max Mosley. E sabem perfeitamente que a batalha entre as duas entidades chegou ao ponto de ruptura, que aconteceu durante alguns dias, no final de Junho, mais concretamente após o GP da Grã-Bretanha. A solução chegou depois com um novo Acordo da Concórdia assindado por um período de quatro temporadas, até ao final de 2012, e retirada de cena de Max Mosley, substituido em eleições por Jean Todt.


Seis meses depois, todos fazem o balanço do ano, e todos recordarão, certamente, deste capítulo, e muitos mesmo dirão provavelmente que este é um assunto resolvido. Mas outros recordarão que aquele acordo, do qual nunca vimos sequer uma linha dos seus artigos, mas sabemos que existe, não foi mais do que uma forma de "comprar tempo" até 2012. E esta semana, Luca de Montezemolo, o presidente da Ferrari, e o representante máximo da FOTA no inicio do ano (agora o cargo pertence a Martin Withmarsh, da McLaren) recordou-nos disso, ao afirmar numa entrevista feita ao Autosport inglês que caso não se mude certas atitudes até 2012, a marca do Cavalino Rampante pode abandonar a Formula 1.

"Quero melhorar a Formula 1 entre agora e 2012, quando assinaremos um novo Pacto da Concórdia. Senão, teremos motivação em outro lugar", começou por dizer. "Fui a Le Mans e fiquei impressionado. Não podemos aceitar as enormes disparidades existentes entre os pilotos, a imprensa e o público. No passado, as grelhas de partida estavam cheios de meninas bonitas, mas agora fazem lembrar um campo de concentração. Precisamos superar isso.", declarou.

Nessa entrevista, o patrão da Ferrari refere que deve haver um equilibrio em termos de tecnologia e espectáculo, sob pena de perder peso perante outras disciplinas do automobilismo: "Dantes testava-se em qualquer altura, agora não há testes para ninguém. Há que haver um equilíbrio pois parece-me que se foi longe demais. Temos de olhar pelo espectáculo. Parece-me que a FIA está agora mais aberta para o começo de uma nova era. São precisas ideias novas onde é preciso englobar tecnologia, desempenho e pesquisa. Temos de reduzir os custos sem perder os elementos mais atraentes da disciplina".

E refere ainda o capitulo do preço dos bilhetes, demasiado caros na sua opinião: "Precisamos de ter bilhetes a este preço? Hoje em dia, um jovem casal pode dar a volta ao mundo por menos dinheiro do que custa ver o GP de Itália nos lugares VIP. Acha justo?", afirmou.

Já tinha lido um discurso semelhante há umas semanas, quando Carlos Ghosn, o presidente da Renault, também colocava dúvidas sobre a viabilidade da Formula 1, principalmente no caso das novas tecnologias ambientais. "Há grandes desafios sobre o quão justo é isso e como podemos aliar a Formula 1 com o compromisso ambiental. Você pode deixar de emitir gases nocivos combinado com alta tecnologia? Essas são algumas das questões na Formula 1", dizia Ghosn a 24 de Novembro passado, numa altura em que a continuidade da equipa era colocada em causa. Se no caso de Ghosn, o pretexto era aliar a categoria máxima do automobilismo com a promoção de energias limpas, as declarações de Montezemolo podem também apontar nesse sentido.

Mas para quem acompanhou de perto a luta entre FOTA e FIA, recorda-se certamente que em muitos aspectos, isto era um luta de poder. Poder em termos de controlo de regulamentos, no tecto orçamental e na introdução ou não de novas tecnologias, de perferência que funcionem (e não o fracasso que foi este ano o sistema de recuperação de energia KERS) e mais importante, a divisão do bolo orçamental. Como todos sabem, metade dos lucros vão para a FOM (Formula One Management) que lida com as negociações televisivas e dos proprietários do circuitos, em acordos ditos "leoninos", onde Bernie Ecclestone, o homem que está à frente da FOM, faz os acordos que quer, ao preço que quer, aumentando à percentagem que quer, a cada ano. E essa fatia do bolo, que a partir de 2010 será dividido por treze, em vez dos dez existentes em 2009, Montezemolo (e as restantes equipas) ambicionam.

Mesmo com todos os dados em cima da mesa, e do qual qualquer um pode interpretar como quiser, uma coisa é certa: a Formula 1 entra numa encruzilhada, no ano em que comemora o 60º ano da sua existência. É uma crise de meia idade, como diz o Luiz Fernando Ramos, o Ico, no seu mais recente post. E ele também diz outra coisa, e passo a citar: "Como eu já coloquei diversas vezes aqui no blog e falei na rádio: o acordo costurado esse ano é apenas um cessar-fogo no front. A guerra, porém, continua, mas agora no campo da diplomacia." E temos mais três temporadas para que estes problemas sejam solucionados. Cabe a Jean Todt, um ex-homem da Ferrari, e agora o novo homem á frente da FIA, levar este barco a bom porto.

Mas Ecclestone não é esquecido. Montezemolo não o deixa passar em claro: "Ao lado de Bernie Ecclestone, sou a pessoa mais antiga no paddock e ambos partilhamos a mesma paixão geniuna pela modalidade". Ora, sabendo que Bernie fará 80 anos em 2010 e como já referi atrás, a sua influência é grande, haverá sempre alguém que desejará aquilo que o "anãozinho tenebroso" controla neste momento...

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