sexta-feira, 30 de abril de 2010

Grand Prix (agora sim, o numero seis)

(continuação do capitulo anterior)

Com o passar das semanas, as sessões de fisioterapia tornaram-se menos penosas para Pete, pois queria pôr-se bom depressa, mesmo que a partir dali não voltaria mais a um cockpit de automóveis, queria brinca um pouco com o seu Ford Mustang Shelby 500, o seu novo brinquedo na garagem, fornecido pelo proprio Carrol Shelby, seu amigo de longa data e um dos seus modelos no inicio da sua carreira, já nos distantes anos 50 naquelas corridas californianas, onde certo dia cruzou-se com outro entusiasta automobilistico, um tal de James Dean, num Porsche Spyder. E ele invejou esse carro, que julgava ser melhor que o MG adqurido em segunda mão, com o dinheiro juntado com muito suor através do seu trabalho de mecânico na garagem do seu tio...

Mas esses dias já apareciam na sua cabeça algo distantes, com nostalgia. Queria voltar a reviver esses dias despreocupados, mas neste final dos anos 60, o mundo era diferente. A par dos lançamentos do Programa Apollo, rumo à Lua, numa corrida especial contra os Soviéticos, falava-se todos os dias se da Guerra do Vietname, com os combates por um lado e os protestos do outro, de uma geração que só queria paz e amor e cantavam "We Shall Overcame" de Joan Baez, enquanto experimentava LSD e marijuana, que ouvia Beatles, Bob Dylan, Rolling Stones ou Mamas & Papas em vez de Elvis Presley ou Beach Boys, e experimentava sons estranhos vindos do outro lado do Atlântico, especialmente uns tais Pink Floyd... era um mundo estranho, este que o vivia.

E agora, afastado que estava do centro do automobilismo, reparava nisso tudo. Nessa revolução dos costumes, onde um visual "clean" tinha sido substituido pelos cabelos longos e visual "hippie" e o lugar onde todos queriam estar era São Francisco, para ouvir Greatful Dead enquanto apanhavam uma pedrada de LSD ou marijuana. E liam William S. Burroughs, com o seu "Naked Lunch", sonhavam em fazer tal como fez Jack Kerouac no seu "On The Road"... Aaron leu Kerouac na sua juventude e gostava da ideia de viajar pelas planicies americanas, mas como forma de terapia entre temporadas. Só tinha feito uma vez, cedo, quando foi ver uma Las Vegas ainda no seu inicio da febre do jogo. Deslumbrou-se com as luzes, é certo, e ainda jogou, mas quando quase descobriu que estava sem dinheiro para voltar para casa, penou para chegar, deixando o seu relógio como penhor quando o dinheiro acabou. Mas conseguiu gasolina o suficiente para chegar a casa.

Essas recordações da juventude pareciam já distantes. Veio uma nova década, e o mundo mudara completamente. E ele notava isso. Sabia que aquele não era o seu mundo.

Uma quinta-feira à tarde, o telefone tocou. Pete estava em mais uma sessão de fisioterapia no quarto de ginástica que tinha em sua casa. Com um fisioterapeuta ao seu lado, para tratar das suas pernas, que necessitavam de ganhar músculo. Pamela, a sua mulher, atendeu. Uma voz familiar falava do outro lado da linha.


- Estou, o Pete está aí?
- Está sim, mas está a a fazer exercício. Quem fala?
- É o Dan.
- Dá-me um momento, está bem?
- OK.


Pousou o auscultador e chamou Pete. Apoiado numa bengala, apesar de já não ter o gesso, sentou-se no sofá ao lado do telefone e atendeu:

- Dan?
- Olá Pete! Estou feliz por ouvir a tua voz.
- Ainda bem.
- Como vai a tua reabilitação?
- Vai bem, já tirei o gesso, mas continuo a fazer excercício para ganhar músculo.
- As festas foram boas?
- Foram optimas. E as tuas?
- Nada com que me queixar.
- Optimo. Que contas?
- Pete, sei que tu estás retirado, mas gostaria que viesses à minha oficina para discutirmos um assunto.
- Ah é? Porquê?
- Acho que preciso da tua ajuda.
- Em que sentido?
- Preciso dos teus conselhos, Pete.
- Mas Dan, acho que te safas bem com a tua equipa.
- Mas esta está a ficar grande demais. É por isso que preciso de ti. És capaz de vir cá?
- Está bem Dan. Eu apareço aí. Quando?
- Pode ser amanhã. Vou testar em Riverside, não muito longe da tua casa.
- OK, lá estarei. Até lá.
- Até amanhã, Pete.


Pete desligou o telefone. Do outro lado estava Dan Gurney, um piloto da sua geração, cuja rivalidade inicial se transformara numa amizade profunda, especialmente quando juntos, no inicio da década, aventuraram-se na Europa para correr nos Grandes Prémios. Primeiro Dan, quando foi para a Ferrari, depois Pete, quando correu na Cooper, ao lado de outra boa amizade, o jovem neozelandês Bruce McLaren. Ambos tinham nove anos de diferença, e Pete sempre admirou a sua capacidade mecânica e de engenharia. Graças a ele que mais do que um mecânico, tornou-se num grande conhecedor da engenharia dos carros de Formula 1. Quando no final de 1964, ambos separaram-se, Pete foi para a Jordan e Bruce fez a sua prória equipa, a exemplo de Dan Gurney, com a sua Eagle.

Dan sabia que Pete sempre ficou com a ideia de fazer a sua própria equipa, mas as suas aventuras na Jordan, e depois na Yomura, fê-la adormecer na sua mente. E agora, com este acidente que praticamente terminou a sua carreira, Pete pensava nisso. Mas também sabia que isto não era um empreendimento fácil. E se Dan o chamava, era porque as coisas não estavam a correr muito de feição para ele. Na temporada que passou, somente conseguira seis pontos, resultantes de dois quartos lugares. Claro contraste com a vitória de Spa-Francochamps no ano anterior...

No final, Pete sabia o que era, mas perferiu guardar. Amanhã, iria tirar todas as dúvidas que pairavam na sua mente. Levantou-se e voltou para o seu ginásio.

(continua)

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