quarta-feira, 21 de julho de 2010

Grand Prix (excerto numero 36, começo em Kyalami - parte V)

(continuação do capitulo anterior)

Depois de Oliver Henderson agitar a bandeira sul-africana do alto do palanque, o troar das máquinas ouviu-se, mais alto do que nunca, para depois se desfazer à medida que se aproximavam da Crawthorne Corner e faziam, velozes, a primeira das 78 voltas completas ao circuito de Kyalami, perante o delírio das dezenas de milhares de pessoas que assistiam à passagem dos seus ídolos pelos sitios onde estavam colocados. Nas boxes, todos estavam atentos, uns no muro, outros agarrados aos cronómetros, para tirar os tempos dos pilotos que estavam em pista.

Na primeira passagem pela meta, John O'Hara segurava um Gilles Carpentier que o estava prestes a ultrapassá-lo no final do The Dip, para alcançar o comando da corrida. Teddy perdera dois lugares a favor de Van Diemen e Reinhardt, e tinha Beaufort a ameaçá-lo. Um pouco mais atrás, a meio, Philip de Villiers tentava aguentas as investidas de Bruce McLaren, que tinha passado Brian Hocking e vinha em busca do outro sul-africano. Ambos rodavam no oitavo e nono lugares, respectivamente, com Hocking a fechar o "top ten". As coisas pareciam não correr bem para a Apollo e pouco depois, o "speaker" confirmava:

"O novo lider da corrida é agora o francês Gilles Carpentier, no seu Matra, que passou o Apollo de John O'Hara no final da Crawthorne Corner". A multidão agitou-se.

À medida que as voltas passavam, Carpentier estava a afastar-se paulatinamente de O'Hara, graças à potência do seu motor. Um pouco atrás, McLaren passara De Villiers e ia tentar apanhar os da frente, e agora estava entalado entre Peter Revson e Bob Bedford. Ele conseguia apanhar Bedford, no seu novo carro, enquanto que era assediado pelo piloto americano. no final da volta sete, Revson passava De Villiers, caindo para o décimo lugar, mas continuava na frente de Hocking.

Por esta altura, já havia um carro encostado à berma. Bob Turner desistira no seu BRM depois do motor ter explodido permaturamente. Ao ver o V12 britânico a fumegar, tão cedo na corrida e com o calor que se fazia sentir, os que estavam nas boxes temiam que isto poderia ser o primeiro de uma longa série de desistências...

Quando Pete viu Bob Turner a caminhar para a boxe, afirmou:

- E pronto, vai ser o primeiro de muitos.
- Fizemos o melhor da nossa parte, respondeu Thomas.
- Quero é saber se isso é o suficiente.
- Descansa. Acredita que é, respondeu sorrindo.

No final da décima volta, a diferença entre Carpentier e O'Hara era já de seis segundos. O piloto da Matra estava a imprimir um ritmo forte, no sentido de ter uma vantagem suficiente para a poder gerir nas voltas finais, quando o carro estiver mais vulnerável. Na boxe da Apollo, os tempos até então tirados mostravam um ar de tranquilidade nas faces, pois mostravam a sua consistência. Solana deixara passar Beaufort, e o francês tinha subido até ao quarto lugar, passando Van Diemen e estando atrás de Reinhardt. Os dois estavam a pouco mais de dois segundos de O'Hara, mas não conseguiam aproximar-se do piloto irlandês. No sexto lugar estava agora Bruce McLaren, depois de passar o BRM de Anders Gustafsson.

Durante as dezasseis voltas que se seguiram, as coisas estavam calmas, aborrecidas até. O calor era a unica coisa do qual todos estavam incomodados, e o pensamento que dominava a todos era saber se o sobreaquecimento iria ser ou não um problema naquela corrida. Enquanto isso, o unico facto relevante foi a ultrapassagem de Carpentier a Reinhardt, chegando ao terceiro lugar. Era uma altura em que todos se protegiam como se podiam do sol. Iam para a sombra ou colocavam chapéus de papel, feitos de folhas do jornal do dia, abanavam como se fossem leques. Todos eles tinham algo em comum: eram sul-africanos brancos. Um fato lateral da corrida, mas um fato.

De repente, quando os carros da frente iniciavam a 27ª volta, começou-se a ouvir um barulho vindo da Clubhouse Bend: um carro tinha encostado, sob um manto espesso de fumo. E não era um qualquer: era o Matra de Beaufort, que tinha desistido com um sobreaquecimento do motor. A sua corrida tinha terminado ali, e ele tinha saído do carro, contemplado e começado a caminhar a pé, rumo às boxes. Alguns minutos depois, um comissário lhe deu uma garrafa de água e uma boleia até às boxes.

E como um mal nunca vem só, três voltas depois outro golpe de teatro: depois de fazer a Clubhouse Bend, Gilles Carpentier engata a terceira velocidade, a caminho dos Esses. Trava, reduz para segunda... e não sai mais dali. O mecanismo tinha quebrado e o Matra, em subida, encosta logo à direita, para espanto de toda a gente. Os carros franceses, que pareciam ir a caminho da dominação, acabam em pouco mais de três voltas. E com isto, a liderança estava de novo nas mãos de John O'Hara.

- Mostrem ao John a placa de P1, logo! ordenou Pete.
- Estamos a ganhar? pergunta Jackie.
- Por agora sim, respondeu Sinead, no alto das boxes. Só espero que aguente.
- E o Phillip?
- Já passou o Bob Bedford e é sétimo, com o atraso do Revson. Mas tem o Toino e o Hocking bem perto, Jackie.

De facto, desde a volta 28 que o americano tinha também problemas com a caixa de velocidades, que era frequente encravar na quarta velocidade, e a relação entre a terceira e a quinta era longa, com o motor a tossir sempre que ele tentava fazer esse salto, devido às baixas rotações. À medida que as voltas iam passando, as dificuldades eram maiores e suspeitava que não chegaria ao final. Abdicara do sexto lugar e tinha sido ultrapassado por De Villiers, Bernardini e Hocking, e parecia arrastar-se. Até onde, não sabia.

Na volta 34, O'Hara começava a dobrar pilotos atrasados, nomeadamente os locais como Pieterse e um arrastado Revson. Reinhardt não estava muito longe e aproveitava para tentar aproximar-se do irlandês. Quando subiam a Leeukop Bend, O'Hara demorou mais tempo a engatar a marcha e Reinhardt fez uma aproximação suficiente para se por de lado para o ultrapassar. Os dois motores V8 roncavam lado a lado quando se aproximavam do "The Dip", perante o delirio da multidão e o desespero da irmã:

- Caramba, não o deixes passar!
- Tem calma que ele não te ouve, respondeu Pete. Isto não foi bom, confesso... diabos, vamos perder de novo o comando da corrida. Espero que isto compense no final, disse, olhando para Thomas.

Este não disse nada. Apenas olhava para a pista, silencioso e algo confiante.

E de facto, foi isso que aconteceu. O piloto alemão era agora o novo comandante da corrida, o terceiro em paragens sul-africanas. E a corrida estava a chegar paulatinamente ao seu meio, com o calor a fazer-se sentir em tudo e todos.

(continua)

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