terça-feira, 14 de setembro de 2010

Grand Prix (numero 72, o descanso do guerreiro)

Na mesma segunda-feira em que a federação alemã se reunia de emergência, Alexandre e Teresa tinham desembarcado em Coburgo com uma multidão de repórteres à sua espera no aeroporto, que o bombardearam de perguntas sobre a corrida e sobre o automobilismo em geral. Todos queriam entrevistá-lo, até na televisão, e a todas decidiu aceder nos quatro dias seguintes. No final desse tempo, estava cansado e só queria ir a Monforte para desligar-se do mundo.

Entre entrevistas, tentou resolver a seu favor um assunto pendente entre ele e Teresa, a mulher que amava e que gostaria de a ter no seu lado o mais tempo possivel, para evitar as tensões e as distâncias que levaram à situação de ruptura temporária naquele fim de semana britânico, e para tal, tinha uma ideia mirabolante, alimentada por Pete, o seu patrão americano.

Nesses quatro dias de Coburgo, perguntou a Teresa se não podia hospedá-lo em sua casa, e após as entrevistas feitas, no dia 21 de Julho, véspera da partida para Monforte, levantou-se cedo, mais cedo que ela faria para ir trabalhar no jornal. Preparou-lhe o pequeno-almoço e entregou-a na cama, num tabuleiro, para depois dizer ao que vinha na cabeça.


- Temos de falar, disse, segurando o tabuleiro.

Ela acordou estremunhada e ficou surpreso com o gesto de Alex. Ficou com uma ideia sobre a razão deste gesto aparentemente romântico, mas somente respondeu:

- Para mim? Que maravilha!

Ela sentou-se na cama, mostrando o seu corpo desnudado, em claro contraste com Alex, totalmente vestido como se fosse sair de casa logo a seguir. Colocou o tabuleiro no colo dela e sentou-se ao seu lado. Depois disse:

- O Pete gostaria de te ter na tua equipa.
- Como assim?
- Gostaria de ter alguém que lide com a imprensa. Organizar conferências, tratar de apresentações, mandar fotos para revistas e jornais, receber convidados, etc, quer no motorhome, quer na fábrica.

Teresa, que estava a saborear o café, pensou durante uns momentos. Depois, respondeu.

- O que ganho com isso?
- Para além do salário? Sempre podes estar comigo, ora. É diferente do que segurar o cronómetro e tomar conta dos tempos... ou se quiseres, tornas-te em mais do que a menina do cronómetro.
- Hmmm... respondeu enquanto acabava de comer. Então vou ser paga por segurar o cronómetro?
- Não. Vais ser paga para escreveres as nossas actividades automobilisticas, dentro do circuito e fora dela.
- Fora dela, como assim?
- Apresentações, entrevistas, testes... estás a ver onde quero chegar.
- Nós temos um nome para isso. Chama-se "acessoria de imprensa".
- Podes chamar o que quiser, querida.
- Hmmm... e ainda queres casar comigo?
- Claro, afirmou, levantando-se da cama.
- Muito?
- Muito.
- Quando?
- Por mim, já esta tarde. Mas se depender dos meus pais, vai ter direito a feriado municipal e tudo...

Teresa riu-se. Colocou o tabuleiro já vazio na mesinha de cabeceira, levantou-se e saltou para o colo dele, afirmando:

- Aceito o teu emprego, mas não caso contigo agora.
- Ah é? Então porquê?
- Ainda sou uma menina tradicional. Quero conhecer os teus pais, vais conhecer os meus, e quero um casamento de véu e grinalda. E como aparentemente existe a possibilidade de um feriado municipal, quero casar em Monforte.
- Bom... se tudo acontecer como planeado, na melhor das hipóteses vai ser daqui a dois anos. Credo! Mas se é o preço a pagar, aceito.

Assim sendo, beijaram-se apaixonadamente. No dia seguinte, já em Monforte, Alexandre gozava o vinho da casa no pátio da sua casa, após o almoço. No pino do Verão, por fim tinha alguma paz e descanso depois dos eventos de Brands Hatch. De óculos escuros e no baloiço da varanda, descansava à sombra, de olhos cerrados, tapados por óculos escuros. Ia quase adormecer quando sentiu alguém sentar-se a seu lado. Olhou e era o seu pai.

- Como sentes?
- Por fim, estou em casa. Agora começo a ter consciência do que fiz, pai.
- E então?
- Sonhei com isto, sabes... glória. Agora é que adoraria ter o Velho por aqui. Estaria muito orgulhoso, de certeza. O Saboga não vem cá? Não o vi em Coburgo...
- Não. Aparentemente, está a negociar.
- O quê?
- Quer trazer a Formula 1 para aqui.
- Ah é? Para onde.
- No circuito.

Alexandre abandonou a sua posição de deitado e tirou os óculos escuros. Encarou o pai e afirmou:

- Ele quer trazer os melhores pilotos do mundo nas ruas estreitas da cidade? Isso é loucura! Isto não é o Mónaco...
- Aparentemente quer isso.
- Mas o futuro são circuitos permanentes! Fazer uma coisa destas, aqui, nas nossas ruas, não é bom, com as altas velocidades dos nossos carros. Não sabes o que se passa com os alemães? Não leste o jornal, pai?
- Li, mas parece que não chegaram a acordo.
- Não é bem assim. Não decidiram se ficam ou se mudam para Hockenheim.
- E isso é bom ou mau?
- Se decidirem mudar, ganhamos. Se não, dia 2 estarei aqui, no almoço de familia.
- Bom, são vocês que decidem, não eu. E acho que a tua mãe ficaria contente se nesse dia ficasses cá.
- Eu sei... já agora, gostaste dela?
- De quem?
- Da Teresa?
- Se tu gostas, eu também gosto. Não posso impedir a vossa felicidade, não é? Agora que és famoso e coisa assim...
- Só ganhei uma corrida, mais nada. Eu este ano não concorro ao título. Mas então gostaste da Teresa, não foi?
- Sim, por aí...
- Otimo, pois é com ela que vou casar.
- Ah é, mas quando?
- Um dia. Mas vou casar com ela, mesmo manco, cego ou surdo.

Nesse momento, o telefone toca na mansão dos Monforte. Uma das suas criadas atende o telefone, que logo a seguir diz:

- Menino Alexandre, telefone para si. Estão a falar do estrangeiro.
- Deve ser o Pete. Já volto.

Alexandre foi para dentro de casa, enquanto que se dirigia ao telefone. Na sala, a sua mãe e Teresa o observam no seu passo apressado, enquanto que ela se levantava e se aproximava o suficiente para ficar na sua mira. Ele atendeu:

- Está sim?
- Aceita receber uma chamada da Grã-Bretanha?
- Sim, pode passar.

Passado um compasso de espera, uma voz do outro lado da linha falou.

- Alex? É o Pete. Boas noticias, eles cederam!
- Quem, os alemães.
- Sim, concordaram com as nossas exigências. O GP da Alemanha vai ser adiado uma semana para que possam preparar tudo, mas vai ser em Hockenheim!
- Excelente, excelente...
- Tem mais. A corrida de Zeltweg vai ser dia 23, uma semana depois do previsto, mas Monza permanece no dia 6 de Setembro.
- São de facto boas noticias, Pete. Obrigado!
- Vá, goza as férias, Alex. Abraços.
- OK, Pete. Até para a semana.

Alex pouco o telefone, viu Teresa e foi ter com ela, abraçando-a e dizendo:

- Vitória. Ganhamos!
- Vai ser em Hockenheim?
- Vai. E pai... dia 2 estarei aqui para o almoço de familia. A prova foi adiada por uma semana, a pedido do Automóvel Clube alemão, e a FIA acedeu. E o GP da Austria vai ser adiado para o dia 23 de Agosto. Aparentemente fizeram um acordo qualquer, e todos ficam felizes.
- Otimo. São de facto boas noticias - afirmou o patriarca da familia - e sendo assim, eu ergo o copo do nosso Moscatel para vocês. Deixa-me ir buscar os vossos copos e vamos brindar à noticia.

Passado um momento, os dois casais iam para a varanda da casa senhorial e ergueram os copos. O mais velho disse:

- À vossa saúde, e à dos teus companheiros. Queira Deus que tenham felicidade e vida longa.

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