sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Extra-Campeonato: Depois da Tunisia, agora o Egito

Em 1989, eu tinha treze anos e mesmo sendo jovem, já tinha consciência de que viviamos um periodo perigoso. Sabia o que era a Guerra Fria e a "espada de Dâmocles" que era a ameaça nuclear. Havia uma Cortina de Ferro e coisas como o Muro de Berlim, a Checoslováquia, a União Soviética e a Alemanha do Leste. Ver uma importante cidade europeia dividida a meio fazia-me impressão, mesmo desconhecendo que tudo aquilo era o resultado da II Guerra Mundial, que tinha começado cinquenta anos antes.

Depois, comecei a ver Mikhail Gorbachov, o lider da União Soviética - o tal "Império do Mal" que Ronald Reagan chamou num dos seus discursos - a falar de palavras como "perestroika" e "glasnost", mudança e reforma. E aos poucos, os velhos regimes bafientos, caducos e monoliticos do Leste europeu, comandados por personagens como Erich Hoenecker ou Nicolae Ceausescu a cairem, de forma ou pacifica ou violenta. Vi inumeros alemães do Leste a passarem pelo buraco criado pelos húngaros, rumo à Alemanha Ocidental, vi Governo e Oposição a sentarem-se um em frente ao outro e negociar a transição, e vi também violência e um final trágico para um ditador, como aconteceu a Ceausescu, fuzilado pelo Exército.

Mas também vi a cereja no topo do bolo: a queda do Muro de Berlim, com milhões a celebrarem o fim de um regime opressivo. E o resto veio depressa, até demasiado depressa: a unificação alemã, a economia de mercado, a entrada na União Europeia. E também vi o fim da União Soviética e o nascimento de novos paises: Letónia, Ucrânia, Georgia...

Hoje, vinte anos depois, ao ver na televisão os milhares de manifestantes a desfilar no Cairo, duas semanas depois de Tunes, entre "viagens" pela Euronews, CNN ou BBC -pois não tenho a Al Jazeera no meu sistema - observo de uma certa forma uma repetição da História. Os prédios do partido do poder a arder, da mesma forma que vi pessoas a atacar a policia e a pegar fogo a carros, sem medo de serem espancados ou mortos. E se é assim no Cairo, também é em Alexandria, Suez e outras cidades. Reparem, se alguém disse que isto iria acontecer no inicio de Dezembro seis semanas antes, ou sorriam de forma condescendente ou chamavam-me louco. E agora, o se pode dizer? Provavelmente, que a panela de pressão explodiu. Isto chegou ao ponto que a população simplesmente está a ignorar as ordens de recolher obrigatório, decretado pelo governo.

O exército está agora nas ruas, ignorando se está a obdecer às ordens governamentais e nada se sabe se o velho Mubarak estava vivo ou morto, se estava no pais ou se tinha fugido, (Nota: mais tarde veio à televisão dizer que iria demitir o governo)

Claro, isto tudo que estou a falar não vai ser visto ou lido no Egito. O governo decidiu desligar os sistemas de comunicação esta madrugada, bloqueando o sistema de telemóveis, a Internet e as redes sociais como o Twitter e o Facebook.

Os próximos dias ou horas serão decisivos para o futuro desse país. Hosni Mubarak está no poder desde Outubro de 1981, quando um atentado matou o seu antecessor, Anwar Sadat. Agora com 82 anos, é um velho doente - não é visto há muitas semanas - e o seu regime musculado está minado pela corrupção. Irá haver eleições em Setembro, e fala-se que ele poderá ou voltar a concorrer ou então ceder o poder ao seu filho Gamal, algo que mesmo dentro do regime não é visto com bons olhos.

Caso caia este regime, será um feito inacreditável, comparado com o que aconteceu no Leste europeu vinte anos antes. Ali houve vários fatores que contribuiram, especialmente o fato de o lider soviético da altura, Mikhail Gorbachov, querer reformas no seu pais, o famoso "glasnost". Mas aqui não há algo que tutele estas revoluções. É o povo, puro e duro, farto destes regimes monoliticos. O resto de região, pelo menos nas cupulas, treme de medo, pois o seu pais pode ser o próximo. Afinal, a lista é grande: Siria, Arábia Saudita, Yemen, Libia...

Sem comentários: