quinta-feira, 19 de abril de 2012

5ª Coluna: porque é que a Formula 1 vai para a boca do lobo

Na sexta-feira, soubemos todos que, contrariando pressões internacionais, os receios das equipas, e os apelos de politicos e ativistas, a FIA decidiu que o GP do Bahrein iria acontecer como planeado, neste domingo, 22 de abril. O comunicado oficial da "FIA", nessa altura, foi lacónico a esse respeito: 

"Todos eles expresaram o seu desejo de que o Grande Premio seguisse adiante em 2012, e desde então, a FIA manteve-se em contato direto com todas as partes interessadas. Longe dos olhares públicos, a FIA recebeu constantemente as informações sobre a segurança [do reino] por parte dos funcionários diplomáticos, bem como outros peritos independentes."

"Com base na informação atual que a FIA detêm neste momento, está convencida de que todas as medidas de segurança que devem ser tomadas para levar a cabo un evento do Campeonato do Mundo de Fórmula 1 no Bahrein estão a ser executadas. Assim sendo, a FIA confirma que o Grande Prémio Gulf Air do Bahrein de F1 2012 acontecerá na data prevista."

Coloco a FIA entre aspas porque me contaram que as equipas decidiram ir numa reunião de sete minutos em que Bernie Ecclestone só falou e os representantes das equipas "não tugiram nem mugiram", simplesmente aceitaram as ordens de Ecclestone. Isto é só para verem como as coisas se passam na Formula 1. Bernie Ecclestone manda, todos obedecem. E a FIA cala-se, porque pouco mais pode fazer do que colocar o carimbo de aprovação sobre aquilo que ele faz. Não tem qualquer palavra sobre o calendário, não tem palavra sobre os lugares que devem ou não visitar. Faz os regulamentos até quanto puderem, e nem sei.

Nos dias seguintes a este comunicado, a Formula 1 tentou justificar-se o injustificável. E o pior veio de Martin Withmarsh, que ainda na China, disse que a segurança do Bahrein era melhor do que a do... Brasil. Poderia até desculpá-lo dizer que confundiu alhos com bugalhos, mas na realidade fez foi piorar as coisas. O Brasil pode ter muitos defeitos, é certo, mas é uma democracia e não tem milhões de pessoas a manifestar todos os dias nem tem uma policia a dispersar os manifestantes com gás lacrimogéneo, como acontece no Bahrein. Em suma, foi uma comparação no mínimo infeliz, para não dizer que foi uma idiotice.

Tambem no inicio desta semana, recordei-me de um grupo português chamado "Os Pinto Ferreira", que escreveram uma musica chamada "Elogio da Estupidez", e que tem a seguinte letra:

Tu tens um jeito singular
Tu tens um toque especial
Deus deu-te um dom tão singular
Que em tudo o que tocas deixas sempre um mau sinal
Contigo tudo acaba mal senão puder piorar

Maravilhosa estupidez
Porque será que só tu não vês
Esse prodígio extraordinário
Tens o toque de midas

Só que ao contrário
Tu tens uns modos tão subtis
Entre o meter o teu nariz
Com uma arrogância insolente
Na vida de toda a gente

Maravilhosa estupidez
Porque será que só tu não vês
Esse prodígio extraordinário
Tens o toque de midas
Só que ao contrário

De facto, temos de reconhecer que Bernie Ecclestone tem um toque de Midas. Ao longo dos últimos 40 anos, transformou a Formula 1 de um bando de garagistas sujos a um negócio de biliões. Alargou a Formula 1 aos quatro cantos do mundo, e trouxe novos mercados, fazendo-o apelativo aos novos ricos do mundo. Mas Bernie tem um grande defeito: é um ser desprovido de qualquer tacto para os Direitos Humanos ou para qualquer sensibilidade humana. Gosta de ganhar dinheiro, não lhe interessa por onde e como. É um homem do século XX do qual se lhe pagam para ir, "convence" toda a gente a ir, porque detesta devolver o dinheiro.

E para melhorar as coisas, é um mentiroso compulsivo, especialmente na parte da ida da Formula 1 à Africa do Sul, nos anos 80, que como sabem, continuaram a lá ir, apesar do isolamento internacional que aquele regime era suspeito. Ele afirmou, num artigo publicado em dezembro no jornal The Independent que reclama os louros pelo fato da Formula 1 ter deixado de ir em 1985 - depois da polémica sobre a ida da Formula 1 a aquele país - por causa do regime em causa. O Keith Collantine, do F1 Fanatic, num artigo escrito ontem, desmontou essa mentira, afirmando que na realidade, a Formula 1 deixou de ir à Africa do Sul por pressão das televisões e dos patrocinadores, que ameaçaram não transmitir mais a corrida, caso ele insistisse em ir ao país em 1986. E ele quis ir, apesar das criticas.

E claro, não se pode esquecer que ele, ao longo do ano passado, quis regressar ao Bahrein após o cancelamento inicial da corrida pelo governo local, com uma primeira colocação da corrida a 30 de outubro, data do GP da India. A FIA até alinhou nisso, antes das reclamações da comunidade internacional e dos construtores serem tão grandes que a ideia fora descartada. Em suma, Bernie sempre quis ir ao Bahrein, porque são eles que lhes fazem "o preço certo".

E na sua insistência em ir para lá, contra tudo e contra todos, claro, criou sarna para se coçar. Os contestatários do regime avisaram, logo na sexta-feira à noite, altura que a decisão foi conhecida, que iriam começar com uma "semana de raiva" e que iriam para a rua todos os dias, para mostrar ao mundo que o Bahrein não era o oásis de paz que o governo pintava e que o Grande Prémio não era mais do que um instrumento politico do qual o governo usa para mostrar que "não havia nada de novo na frente ocidental". Têm visto ao longo da semana que é exatamente o contrário, e à medida que as horas passam até à realização da corrida, as coisas tendem a piorar.

Como já vos disse na semana passada, tomei há muito uma posição: boicoto o GP. Não escreverei uma linha sobre o final de semana competitivo, por simples consciência. Acho que a Formula 1 não pode ser usado como instrumento politico, como é usado agora pela familia real barenita, a pretexto de uma "unificação". Que como podem ver pelos testemunhos diários dos jornalistas no local, é uma mentira pegada. 

E temo legitimamente o final de semana do Grande Prémio, porque provavelmente, o povo sairá em massa para a rua. Os confrontos serão inevitáveis e provavelmente haverão pessoas feridas ou pior. Acham que vale a pena fazer correr sangue?

1 comentário:

Unknown disse...

A formula 1 vai para a BOCA DO LOBO, somente por uma justificativa. DINHEIRO, somente DINHEIRO!!!!! Não estão se preocupando com a integridade dos pilotos e das equipes. Formula 1 virou sinonimo de TEMOS MILHÕES EM INVESTIMENTOS não podemos perder esses PATROCINIOS.

Lamentavel a Formula 1 virar essa maquina de valores ( Dollares, Euros).

Glaucio - RJ - Brasil