sábado, 4 de agosto de 2012

A maior vitória de Juan Manuel Fangio

Sempre admirei Juan Manuel Fangio pela sua consistência. Numa altura em que os acidentes mortais aconteciam a um ritmo assustador, o piloto argentino sempre foi um piloto que "pensava" as corridas e sabia onde estavam os seus limites, bem como as do carro. Há aliás uma frase que não mais esqueci, dita por ele: "Conheci pilotos mais corajosos do que eu. Estão mortos". Só por ele dizer tal coisa, isso significa que não é fazer as curvas mais velozmente ou travar mais tarde na meta. é fazer as coisas bem, sem acabar na valeta com o pescoço partido.

Fangio é um sobrevivente porque pensava as corridas e marcava o seu ritmo. Só que muitas vezes, o seu ritmo era superior aos outros, e os que tentavam acompanhar, muitas vezes acabavam na valeta, numa cama de hospital ou na morgue. Os "corajosos" que ele fala no seu tempo foram muitos: Eugenio Castelotti, Luigi Musso, Alfonso de Portago...

E foi essa consistência que fez Fangio conseguir títulos. Isso, quando tinha a melhor máquina do campeonato. Conseguiu títulos com carros da Maserati, Mercedes e Ferrari, mesmo que ele não gostasse de Enzo Ferrari e dos seus métodos de pressão (a grande maioria dos pilotos do seu tempo morreram ao volante de Ferraris). E mesmo que certos pilotos não gostassem de correr com ele como companheiro de equipa, como por exemplo, Stirling Moss.

Contudo, a Fangio lhe faltava uma corrida que o colocasse no Olimpo. Uma coisa é ser campeão do mundo várias vezes, com os melhores carros da praça e com uma concorrência de respeito. Mas seria algo aborrecido se ele não fizesse uma exibição de encher o olho, aquele do qual os pais lhes contariam aos netos, 50 anos depois do feito. E para que isso acontecesse, tivemos de esperar para o final da carreira, quando ele já tinha cinco títulos mundiais no bolso e com 46 anos de idade. 

O palco era o melhor de todos: Nurburgring Nordschleiffe. Antes dele, somente Tazio Nuvolari tinha feito algo semelhante a ele em 1935, conseguindo-o num Alfa Romeo inferior às maquinas alemãs, numa demonstração tão surpreendente que os alemães nem tinham o disco com o hino italiano! E nisso, mais uma vez, Nuvolari salvou o dia, pois andava sempre com um vinil com a musica. Mas em 1957, eles tinham o hino argentino, pois achavam que Fangio era o favorito numero um. Como sabia que o Maserati 250F tinha um depósito mais pequeno, ele tinha decidido fazer um reabastecimento para andar a par dos Ferrari.

Quando foi a sua vez de parar, na 11ª volta, ele tinha à volta de 30 segundos de vantagem sobre Mike Hawthorn, o segundo classificado, e pelo caminho tinha tirado doze segundos à melhor volta na corrida, de 9.41, para 9.29. Mas os mecânicos cometeram um erro no reabastecimento - um dos mecânicos perdeu uma porca - e o argentino perdeu mais de um minuto. Quando sai, tem uma desvantagem de 45 segundos sobre Mike Hawthorn e Peter Collins. Tinha dez voltas para recuperar, e não iria ser fácil.

Mas ele o fez: bateu o recorde da pista em nove ocasiões, caindo dos 9.29 para o tempo final de 9.17,4 segundos, e conseguiu recuperar o tempo suficiente para apanhar os Ferrari. Todos estavam espantados com o que fazia, sem erros, apenas a dar o seu melhor, indo mais acima na sua coinsistência. Os mais velhos, provavelmente, lembraram-se de Nuvolari em 1935, e quando Fangio os apanhou na última volta, foi-lhe relativamente fácil ultrapassá-los. Primeiro Collins, na "Nordkurwe", e depois Hawthorn, na "Breidscheid", depois de o ter apanhado um pouco antes, na "Adnauderforst". 

No final, com a amostragem da bandeira de xadrez, Fangio era aplaudido por todos. Hawthorn e Collins eram os primeiros a aplaudirem o feito do veterano argentino. Cansado e algo surpreendido pelo seu feito, afirmou algo profético: "Nunca pilotei assim antes e sei que não vou fazer nada assim novamente". Tinha razão. Aquela tinha sido a sua 24ª e última vitória na Formula 1, e menos de um ano depois, abandonava a competição. Mas o seu lugar na história, que já o tinha antes, estava agora escrito a letras douradas. O "Maestro" tinha merecido tal nome.

Anos depois, Fangio explicou o que tinha passado naquele dia: "Nurburgring sempre foi a minha pista favorita. Apaixonei-me por ela e acreditei que em 1957 tinha por fim a entendido. Era como por fim tinha decifrado todos os seus segredos e por fim podia dar o seu melhor. Nos dias após a corrida, não consegui dormir, porque ainda fazia mentalmente aquelas curvas, indo mais longe do que alguma vez tinha feito".

Quanto ao carro, o seu carro de Nurburgring, com o numero um no chassis, está na sua Balcarce natal, no seu museu. O seu carro a seu dono, e é bem merecido.

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